Mealheiro #81: Felicidade, Riqueza e Pobreza
Como as classes sociais moldam as nossas emoções
Alguma vez pensaste como é que a riqueza e a pobreza influenciam a tua felicidade e as emoções positivas que experimentas? Não? Mas outras pessoas já, e hoje vou-te falar sobre isso.
O dinheiro compra felicidade?
A questão sobre se o dinheiro compra ou não a felicidade é antiga. Muitos acreditam que mais dinheiro se traduz em mais felicidade, mas a ciência oferece-nos algumas nuances interessantes sobre isto. Um estudo realizado em 2017 por Paul Piff e Jake Moskowitz investigou exatamente isso: a relação entre a classe social de uma pessoa e a forma como a mesma experiência emoções positivas.
Os investigadores usaram uma amostra representativa dos Estados Unidos, composta por 1.519 pessoas, para examinar como diferentes níveis de riqueza se correlacionam com sete emoções positivas distintas: diversão, admiração, compaixão, contentamento, entusiasmo, amor e orgulho.
Primeiro, é importante entender a distinção entre emoções orientadas para o Eu e para o Outro. Emoções orientadas para o Eu são aquelas que se concentram no próprio indivíduo, como o orgulho e o contentamento. Por outro lado, emoções orientadas para o Outro são aquelas que envolvem uma conexão com os demais, como a compaixão e o amor.
Riqueza e emoções orientadas para o Eu
Vamos começar pelos mais afortunados. Pessoas de classes sociais mais altas tendem a experimentar mais emoções orientadas para o Eu:
Orgulho: esta emoção é sentida quando alguém alcança sucesso numa tarefa valorizada socialmente, aumentando o seu estatuto dentro do grupo. No estudo, os indivíduos de classe alta relataram sentir mais orgulho;
Contentamento: esta emoção é experienciada quando se aprecia as circunstâncias atuais da vida e os sucessos recentes. Pessoas mais ricas relataram sentir mais contentamento, refletindo uma maior satisfação com as suas vidas;
Diversão: a diversão, a alegria que se sente ao encontrar humor nas situações diárias, também foi mais prevalente entre os mais ricos. Isso pode estar relacionado com o facto de terem mais oportunidades para atividades recreativas.
Pobreza e emoções orientadas para o Outro
Agora, vamos falar sobre aqueles em classes sociais mais baixas. Surpreendentemente, essas pessoas tendem a sentir mais emoções orientadas para o Outro:
Compaixão: esta emoção envolve um sentimento de preocupação pelo bem-estar dos outros e estimula comportamentos de cuidado. O estudo mostrou que as pessoas de classes mais baixas experimentam mais compaixão;
Amor: este sentimento de apego positivo e confiança no outro como um cuidador confiável também é mais forte nas classes mais baixas. Esta foi a primeira vez que um estudo demonstrou esta tendência;
Admiração: este sentimento de deslumbramento ao observar algo grandioso ou bonito é mais comum entre as pessoas de classe baixa. Isto é curioso, especialmente se considerarmos que pessoas mais ricas tendem a ser mais narcisistas, o que pode limitar a sua capacidade de sentir admiração.
Entusiasmo: a exceção
Uma surpresa no estudo foi que não houve diferenças significativas no entusiasmo entre as diferentes classes sociais. O entusiasmo é a emoção que sentimos quando estamos ansiosos por algo positivo que está para acontecer. Parece que, independentemente da classe social, todos nós podemos sentir essa excitação de esperar por algo bom.
Implicações do estudo
Estas descobertas têm implicações profundas sobre como entendemos a felicidade e as emoções. Pessoas de classes sociais mais altas, com mais recursos materiais e autonomia, tendem-se a focar mais em si mesmas, procurando independência e autonomia. Isso reflete-se em emoções como orgulho e contentamento.
Por outro lado, pessoas de classes mais baixas, expostas a mais ameaças e com menos recursos, desenvolvem um foco maior nos outros. Emoções como compaixão e amor ajudam a formar laços interdependentes cruciais para enfrentar as adversidades.
Contexto histórico e teórico
O estudo conecta-se a uma longa linha de pensamento teórico sobre a relação entre recursos materiais e bem-estar emocional. Por exemplo, o filósofo Thomas Hobbes descreveu a vida dos humanos como "nasty, brutish, and short", especialmente em relação aos pobres. Esta visão foi amplamente aceite até que estudos mais recentes começaram a desafiar essa simplicidade.
No arts; no letters; no society; and which is worst of all, continual fear and danger of violent death; and the life of man, solitary, poor, nasty, brutish, and short.
Thomas Hobbes
Pesquisas anteriores mostraram que, embora a satisfação com a vida seja geralmente maior entre os ricos, isso não se traduz necessariamente num maior bem-estar emocional. Por exemplo, um estudo usando a Gallup World Poll de 132 países descobriu que o rendimento estava fortemente associado à satisfação com a vida, mas menos com emoções positivas e negativas sentidas no dia anterior - ou seja, uma satisfação geral para com a vida que tinham, mas com pouco impacto no seu dia a dia.
Noutro estudo (Kushlev, Dunn, & Lucas, 2015), pessoas com rendimentos mais altos relataram menos sentimentos de "tristeza", mas não mostraram mais propensão a relatar sentimentos de "felicidade" em comparação com pessoas de rendimentos mais baixos. Esses resultados indicam que uma classe social mais alta pode estar apenas levemente relacionada a um aumento do bem-estar geral.
De uma forma geral, o estudo sugere que, embora o dinheiro possa trazer certos tipos de felicidade, ele não é a única via para alguém se sentir bem. As pessoas encontram alegria e satisfação de diferentes maneiras, dependendo das suas circunstâncias e recursos.
Implicações práticas
Implicações para o bem-estar pessoal
Com base nestas descobertas, podemos refletir sobre como aplicá-las nas nossas próprias vidas. Se te consideras de uma classe social mais baixa, podes reconhecer a importância das conexões sociais e das emoções orientadas para os outros, como a compaixão e o amor, para o teu bem-estar emocional. Formar laços fortes e criar redes de apoio pode ser um recurso poderoso para enfrentar adversidades.
Por outro lado, se estás numa posição social mais alta, podes-te concentrar em cultivar emoções que promovam a satisfação e o orgulho. No entanto, é igualmente benéfico desenvolver um senso de admiração e compaixão, equilibrando as emoções orientadas para o Eu com aquelas voltadas para o Outro.
Implicações para a sociedade
A nível macro, estas descobertas podem influenciar políticas públicas e iniciativas sociais. Programas que incentivam a compaixão e o apoio comunitário podem ser particularmente eficazes em áreas economicamente desfavorecidas. Por outro lado, iniciativas que promovam a apreciação de realizações pessoais e contentamento podem beneficiar indivíduos de classes mais altas, contribuindo para uma sociedade mais equilibrada emocionalmente.
A conexão entre emoções e saúde
Outra dimensão importante é a ligação entre emoções positivas e saúde. Estudos mostram que emoções como a compaixão e o amor não apenas promovem o bem-estar emocional, mas também podem melhorar a saúde física, reduzindo o stress e fortalecendo o sistema imunológico. Portanto, fomentar essas emoções pode ter benefícios a longo prazo.
O papel da educação
A educação também desempenha um papel crucial. Ensinar crianças e jovens sobre a importância de diferentes tipos de emoções e como elas podem ser desenvolvidas, independentemente da classe social, pode criar uma base sólida para o seu bem-estar futuro. Programas escolares que incentivem a empatia, a colaboração e a apreciação das pequenas coisas podem ajudar a moldar adultos mais felizes e equilibrados.
Conclusão
Então, o que aprendemos com tudo isto? A felicidade é mais complexa do que simplesmente ter mais ou menos dinheiro. As nossas emoções são moldadas por muitas coisas, incluindo a nossa posição social e os recursos aos quais temos acesso. Mas a boa notícia é que todos nós, independentemente da nossa classe social, podemos encontrar maneiras de sentir e cultivar emoções positivas.
A verdadeira felicidade não reside na quantidade de riqueza que possuímos, mas na capacidade de cultivarmos emoções positivas, independentemente da nossa posição social.
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Até uma próxima vez - Guilherme
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